"Dia e Noite", M.C. Escher

sábado, 29 de setembro de 2007

O Dono da Culpa

No início (não no início propriamente dito... era apenas a Grécia antiga), a culpa era de homem que ofendeu os deuses - e se pode ofender muita gente sem saber o que se está fazendo. Não importava se o homem que você assassinou era, à primeira vista, um tiranete de beira de estrada; não importava se a mulher com quem você dormiu era uma viúva desconhecida. Mesmo sem a consciência do crime, o castigo era inevitável. Que cobrisse a cabeça de cinzas, espetasse os olhos e fosse tatear pelo mundo com um pires na mão, sem direito a uma rabeca desafinada que inspirasse a piedade dos que passam!
Milhares de anos depois, a culpa passou para os judeus (sim, existem vários culpados intermediários – os judeus entre eles, em outras épocas -, mas eu não vou falar de todos), acusados de uma quinta-coluna meio esquisita que, no entanto, era uma mentira psicológica bastante eficaz para um país que não sabia tão bem o que era ser derrotado: não se perdera a guerra no front pelos ataques de americanos, franceses e ingleses, mas pela punhalada traiçoeira dos judeus. Acusados de formarem “uma panelinha internacional pequena, sem raízes, que está lançando as pessoas umas contra as outras, que não quer que elas tenham paz”. Mais tarde, Adolf Hitler comentou que se não existissem os judeus, seria preciso inventá-los (ou coisa do tipo). “É essencial ter um inimigo tangível, não um abstrato”. E nada como um inimigo comum pra unir um povo.
Depois, a culpa passou para o mordomo (talvez tenha sido antes. Sei lá quando foi o auge dos filmes de detetive!). Claro, não um mordomo qualquer, mas o mordomo de postura ereta, elegante, altivo, com uma calvície avançada, luvas brancas e gravata borboleta. Na sala de música com o castiçal ou na biblioteca com o revólver antigo de fabricação alemã, o culpado sempre era o mordomo.
Até que um dia – uma manhã de sol, especificamente - a culpa passou para a senhora Sociedade. Os crimes que um dia foram atribuídos aos judeus e aos mordomos, na verdade, eram todos obra dessa senhora perversa, responsável por toda violência, toda desigualdade, toda injustiça. Só nos resta o consolo de saber que ela está sendo punida. Aumentaram-lhe os impostos e cortaram a educação de qualidade e o atendimento médico gratuito para seus filhos. Um dia, mandam a Sociedade pro xadrez!

4 comentários:

Anônimo disse...

Opa!

Sao 3 leitores, agora.
Cuidado pra fama nao subir à cabeça!

*Ferdinand, mt boum seu post.

Ferdinand Saraiva Maia disse...

Eu questiono a contabilidade!
Como eu passei a colaborar para o site, eu não posso ser honestamente calculado como leitor.
Então são os mesmos dois leitores! Mas só de não ter perdido metade do público, já é alguma coisa.
Obrigado!

Unknown disse...

comentários politicamente incorretos???(rs...desculpa)...cara, a maioria deles tem razão...repudiar e esquecer é fácil, basta começar a escrever sobre a morena do ônibus...crônicas de um mendigo qualquer ou a dúvida na hora de ser livre (pergunta como é isso ao sartre)

guy...great post...só toma cuidado com as visões de fantasmas vilões pertencentes a uma coisa chamada história!!!...abraço...

Ex-Pirro disse...

Depois não venha me dizer que Xadrez é só pra a Zelite!